De volta a casa - Parte 2
-Foste rápida - disse o Edu ao ver-me entrar na cozinha 8 minutos depois de ter saído de ao pé deles para ir tomar banho.
-Eu disse que não demorava.
-Mas tu tomaste banho? - perguntou o Carlos
-Não, fiquei a olhar para a banheira. É óbvio que tomei banho.
-Mas não passou nem um quarto de hora.
-Quem devia ir à tropa eras tu. - disse eu - havia de ser lindo, entre o fazer a cama e ter 5 minutos para vestir não sei o que seria mais hilariante.
-Ai que piada. - disse o Carlos
-Oh mana não é suposto na tropa andarem com o cabelo rapado? - disse o Daniel
-Não, isso era no tempo do ultramar. Desde que não ande de cabelo à solta posso o ter até aos pés se quiser, quer dizer poder não podia porque os rapazes não podem ter o cabelo comprido mas percebeste a ideia.
-Ok, se bem que te falta pouco para o cabelo te bater nos pés.
-Não está assim tão grande. - disse eu
-Pois não e está muito giro - disse a MJ
-Obrigada. - disse - Vês está aceitável.
-Se tu o dizes...
Bem até agora não foi assim muito mal mas os meus pais também não estão em casa por isso o pior ainda está para vir.
TRIMMMMM!!!!!!
Reformulando a frase....... os meus pais não estavam em casa. Foi má ideia ter vindo, foi mesmo muito má ideia e não sou só eu que penso isso ou o resto do pessoal não teria congelado quando ouviu a campainha tocou como se estivessem a ver o fim do mundo.
-Obrigado por nos terem ido abrir a porta. É sempre bom saber que os nossos filhos se preocupam connosco. - disse o meu pai
Ele estava velho, não pensem que não sei que as pesoas envelhecem, mas ele estava mesmo velho, o cabelo que em tempos tinha sido da mesma cor castanha que o meu e dos meus irmãos era agora branco, a expressão da cara era mais branda e terna como se o tempo o tivesse amolecido e tinha rugas na cara e mãos e estava também mais gordo. A minha mãe, que vinha logo atrás dele com uns sacos de roupa, estava mais magra, o cabelo continuava com a mesma tonalidade loira que nem eu nem os meu irmãos tinhamos herdado, o rosto continuava sem uma única ruga, não fosse ela uma cirurgiã plástica de renome, mas a sua expressão continuava "fria".
Não me consigo mexer, eu congelei, nem dei conta que se tinha passado assim tanto tempo para os meus pais abrirem a porta por eles mesmos, podiam ter passados anos que eu não me teria apercebido. Estava demasiado ocupada a tentar bloquear as imagens que a minha mente me tentava a todo o custo mostrar.
"-Nem por cima do meu caixão!!! Nenhum filho meu será artista, vais ser médica como os teus irmãos...cardiologista ou neurocirurgiã. Artista nunca! - gritava o meu pai completamente fora de si
-O que é que é isto?! - perguntava-me a minha mãe ao apontar para um desenho que estava num dos meus cadernos - Não tens vergonha de andar com isto nos livros?"
-Daniela querida já chegaste! - disse a minha mãe - olha o teu cabelo tens que o cortar, não podes ir assim para o casamento do Rui. E temos de ir comprar um vestido porque duvido que tenhas alguma coisa decente para vestires.
-Acalma-te - sussurrou o Daniel ao passar por mim - Vou ver a Alexandra - disse alto.
Acalmo-me? Será que a minha expressão está assim tão mal?
-Deixam-te andar assim na tropa? Pensava que tinham que rapar os cabelos - disse o meu pai ao ver o meu cabelo
Porquê que toda a gente pensa que todos os militares têm de ter o cabelo rapado?
-Ai meu Deus! Não digas isso, onde é que já se viu uma rapariga com os cabelos rapados. Já irem para o tropa é horrível e ainda falas em rapar o cabelo? Meu Deus!
Ah pois é. Já me tinha esquecido que a minha mãe não gosta lá muito que eu seja militar para ela isso era algo para os meus irmãos e não para mim.
-Nem vou comentar. - disse eu saindo do transe
Quando eu falei os meus irmãos, a MJ e a Carla descongelaram automáticamente, como se o facto de eu não desatar a chorar ou a correr dali para fora fosse algo de bom. Não sei se realmente isso não teria sido melhor, o fugir quero dizer.
-Quem é que é o Rui? - disse no tentativa de desviar a conversa de caminhos menos agradáveis.
-Um primo meu, deve ter a idade do Daniel e felizmente vai-se casar, não sei porquê que o vosso irmão não faz o mesmo já tinha idade para tal.
Daniel e casar? Aí estão duas palavras que não podem estar juntas na mesma frase a não ser que exista algo a negá-la antes.
-Bem mãe que exagero. Mais um pouco e estás a dizer que eu também me devia casar. - disse o Carlos.
-E devias. Já está na altura de assentarem.
-Acabei o estágio à três anos e tu já queres que eu me case? - disse o Carlos - Daqui a pouco vens-me dizer que quem já devia estar casada era a Daniela.
Mas é claro. Mas porquê que o meu nome vem sempre à baila?
-A mim é que não me apanhas nisso - disse - O casamento é a última forma de escravidão permitida por lei.
-Ah, ah.
Pronto uma pessoa não pode dizer nada que se desata toda a gente a rir.
-O que é que eu perdi? - disse o Daniel entrando na cozinha com uma trouxa de cobertores ao colo.
-É a Alexandra? - perguntei - posso pegar-lhe?
-Acho que sim desde que não a deixes cair - disse o Daniel - Toma - disse passando-me a minha sobrinha para o colo.
A rapariga é linda! Quando eu lhe peguei ao colo abriu os olhos azuis, da mesma cor dos da Carla, e sorriu-me. Eu sei que todos os bebés sorriem quando vêm uma pessoa, é um reflexo para que gostem deles e não os abandonem, mas mesmo assim não pode deixar de sorri-lhe de volta e dizer com um grande sorriso:
-Olá Xana.
-Digam lá o que é que aconteceu de tão engraçado para o Eduardo se estar a rir como uma hiena. - disse o Daniel
-Foi a teoria sobre o casamento da tua irmã - disse a Carla
-Na realidade a teoria não é minha - disse - é de um amigo meu da academia.
E era. A teoria era do Ricardo, soube dela durante uma das nossas "rotinas" de perguntas a caminho da faculdade, sim porque agora vou com ele para a faculdade. Uma semana no meu carro e outra no dele, curiosamente é sempre ele quem conduz. A ideia é poupar o ambiente, se bem que não foi só a pensar no ambiente que eu lhe sugeri a ideia, mas dessa parte ele não sabe. Bem o que é certo é que parecemos uns doidos a bombardear-nos mutuamente com todas as perguntas que nos vêm à cabeça.
Até é engraçado e fiquei a saber imensas coisas sobre ele. Por exemplo: ele sabe pilotar aviões (aprendeu na academia), faz esgrima, tem um irmão da minha idade,o Jorge, a tirar engenharia civil em Coimbra, a mãe é médica de medicina geral e trabalha no Porto e o pai é Tenente-Coronel no Quartel do Porto.
-Amigo? - perguntou a mãe com um tom de voz esperançado
Porquê que eu fui abrir a boca? Porquê? Estava tão bem calada, mas não tenho que dizer que a teoria é de um rapaz. Estou feita! Vou ser torturada até obter informações.
-Sim maninha, quem é que é esse amigo? - disse o Eduardo de forma maliciosa
Porquê que eu abri a boca.
-Um amigo meu da academia. - disse calmamente
-Como é que se chama, o que é que está a tirar, que idade tem, o que fazem os pais, onde é que vive? Ah sim e como é que é? - disparou a minha mãe.
E ainda dizem que é difícil arrancar informações aos criminosos. Está-se mesmo a ver que não conhecem a minha mãe, a mulher se fosse descoberta pela CIA era logo usada para interrogatórios.
-Chama-se Ricardo, está a tirar medicina, tem mais dois anos que eu, a mãe é médica e o pai militar e vive no Porto. Não queres também o número do BI, a cedula de nascimento, o número da licença de porte de arma e a carta de condução? - disse a rir-me
-Licença de porte de arma? - disse a minha mãe assustada.
-Sim, qual é o espanto? Até eu tenho licença de porte de arma.
Bem, esta deixou a minha mãe sem cor. O que lhe aconteceria se soubesse que eu sou a melhor atiradora da Academia?! Bem pelo menos não se apercebeu que o Ricardo já tem 20, a idade do Edu, senão aí a mulher caia para o lado. O que até nem tinha nada de grave porque tem a cozinha cheia de médicos.
-Já podias ter dito não? - disse o Carlos - Agora vou passar o tempo todo a olhar por cima das costas com medo que me mates.
-Queria que fosse surpresa, estava com esperança de vos matar todos pela calada da noite.
-Tu trouxeste a pistola? - berrou a minha mãe
-Não a podia deixar na Academia. Ainda ma roubavam.
-Meu deus. Socorro! - disse a minha mãe
-Tu andas armada? - perguntou a MJ que tinha estado a olhar para mim com um ar inquisidor. De certeza que ela sabe somar 18+2.
-Descansa! A arma está no fundo da minha mala e está descarregada, não há perigo nenhum.
-Mas tu sabes disparar uma arma? - perguntou o Daniel
-Não que ideia. Tomaras tu saber disparar como eu.
-BUAHHHHH!!!!!!BUAHHH!!!!! - começou a Alexandra a berrar.
Bem a rapariga tens uns belos pulmões, disso não há dúvida.
-Pronto querida - disse a Carla ao tirá-la do meu colo - Tens fome é?A mamã já te dá comida.
-Daniela já arrumaste as tuas coisas? - perguntou a MJ
Lindo, aqui vai uma que não se vai calar enquanto não souber tudo sobre o Ricardo. Estou feita. Porquê que eu abri a boca?! PORQUÊ??!!
-Não, queres-me ajudar é? - disse ironicamente
-Claro quer sim - disse a MJ com aquele ar de santinha que eu conhecia tão bem
-Sim MJ nós acreditamos nisso. Quando descobrires quem é o Ricardo diz. E nada de tentar ocultar informação Daniela já todos percebemos que ele tem 20 anos. - disse o meu pai
Desatou toda a gente a rir. O meu pai acabou de mandar uma piada? O mundo está perdido! PERDIDO!!! Bem a cara de espanto dos meus irmãos.
-Bem pelo menos não és a única a saber somar 18+2 MJ. - disse assim que saímos da cozinha.
-Achavas mesmo que fui a única a perceber?
-A julgar pela cara dos meus irmãos acho que foste. - disse a rir-me.
-Muito bem - disse a MJ com um ar ameaçador, ao entrar no meu quarto e a fechar a porta atrás dela. - Quem é que é esse Ricardo?